2020 foi o ano em que fizemos contato com a Covid-19. A imprensa infelizmente tem um papel preponderante e estranho nesse processo. Ideologia, militância e tecnologia criaram um cenário perfeito para uma guerra de informações onde a última preocupação foi, de fato, a saúde e segurança da população.
Essa história começa pouco antes da saída do Ministro Luiz Henrique Mandetta, em abril de 2020, do Ministério da Saúde. Naqueles dias de coletivas espetaculosas a divulgação dos dados ocorria às 16h. Esse balanço passou para às 19h e, posteriormente, às 22h.
Alterar esses horários comprometeu o fechamento das redações e a publicação de dados atualizados que teve sua metodologia e apresentação refeita pelo Governo. Essas são as razões para a criação do Consórcio de Veículos de Imprensa. Uma aberração técnica e um ponto a mais na falência do jornalismo como conhecíamos.
Antes e acima de tudo, quem tem um, não tem nenhum! Uma apuração que tem apenas uma fonte de informação está fadada ao erro. Isto piora quando a fonte está no poder, tanto faz se no âmbito federal, estadual, municipal, esteja no executivo, legislativo ou judiciário.
O jornalismo nesses dias de pandemia abriu mão do óbvio. Ao invés de investigar e procurar fontes alternativas de checagem das informações disponíveis, simples e convenientemente se adaptou ao teatro político.
Quando o Governo Federal comprometeu a estrutura de fechamento das edições e alterou a rotina das redações, a mídia se mexeu. Infelizmente, pelas razões erradas e com uma emenda pior que o soneto.
Para justificar o lançamento do Consórcio, o diretor de jornalismo das Organizações Globo (TV Globo, GloboNews e G1), Ali Kamel, reafirmou o papel da imprensa: “A missão do jornalismo é informar. Em que pese a disputa natural entre veículos, o momento de pandemia exige um esforço para que os brasileiros tenham o número mais correto de infectados e óbitos”.
O Consórcio reafirmou sua parcialidade ao trocar a fonte federal pelas secretarias estaduais. Indiretamente esses veículos “escolheram” os governadores, mantiveram fontes oficiais, só que com outros interesses políticos igualmente ou mais suspeitos ainda.
As secretarias estaduais não tinham interesse, político ou econômico, em dar transparência ao processo. Por isto, a resposta do Consórcio de Veículos da Imprensa à manipulação de dados e omissão de informações do Governo Federal foi pífia. Mais grave ainda quando tempos depois, comparados os dados, não constatamos diferenças entre eles.
O diretor de redação da Folha, Sérgio Dávila, ao defender a iniciativa, explicou o ceticismo que domina os leitores e a crise de credibilidade da imprensa. “Numa sociedade organizada como a brasileira, é praticamente impossível omitir ou desfigurar dados tão fundamentais quanto o impacto de uma pandemia. Com essa iniciativa conjunta de levantamento de dados com os estados, deixamos claro que a imprensa não permitirá que nossos leitores fiquem sem saber a extensão da Covid-19“.
A escaramuça em cima dos números, ampliada pela truculência do Governo e de parte da imprensa, foi mais um factoide. O bom jornalismo tem obrigação moral e ética, de fazer levantamentos paralelos às fontes oficiais. Essa é a missão de transparência e honestidade do jornalismo. Garantir independência dos seus dados, longe de governos, ideologias ou militância.
As coisas andam tão confusas e obscuras que todos querem informar, mas ninguém quer procurar por fontes alternativas e confiáveis de informação. “É triste ter que produzir esse levantamento para substituir uma omissão das autoridades federais. Transparência e honestidade deveriam ser valores inabaláveis na gestão dessa pandemia. Vamos continuar cumprindo nossa missão, que é informar a sociedade”, afirma João Caminoto, diretor de Jornalismo do Grupo Estado.
Se a preocupação fosse mesmo a informação, a imprensa estaria atenta aos dados disponíveis no Portal da Transparência, ligado aos cartórios que precisam registrar óbitos e fornecer documentos necessários para funerais, pensões, aposentadorias, benefícios e outros desdobramentos legais. Lá existe uma área dedicada às vítimas da Covid. Não seria uma boa alternativa?
A melhor maneira de entender esse terrorismo sanitário é perceber sua onipresença em todas as mídias. A referência emblemática dessa situação é a contabilidade mórbida para manutenção do medo. Nada mais patético e manipulador, no melhor estilo previsto por Orwell no seu 1984.
A imprensa incorporou o Ministério da Verdade e faz uso doutrinário dessa situação. Manipula dados para disseminar pânico, nunca informação. Nada ilustra melhor essa situação do que a apresentação dos números da pandemia no início das transmissões esportivas. Lá estão os números de casos, imunizados e mortes. Não se mencionam os curados. Tratar vacinado como imunizado já que as vacinas não imunizam não é fake news?
O consórcio virou uma piada previsível e sem graça. Uma confraria suspeita e na mira da História que não perdoa oportunismo e oportunistas. O economista, filósofo e escritor Thomas Sowell, acerca da imprensa, escreveu “jornalistas não podem servir a dois mestres. Na medida em que assumem a tarefa de suprimir informação ou morder a língua em nome de alguma política, estão traindo a confiança do público e corrompendo sua própria profissão”.